O perfecionista da primazia pela posse de bola e organização tática
- Fernando Gamito
- 15 de nov. de 2018
- 6 min de leitura

A primazia pela bola e o aperfeiçoamento da organização tática. Duas características que resumem na perfeição as ideias que Marco Silva pretende transmitir para dentro de campo. Assim o tem feito esta época no Watford FC, tal como já tinha acontecido nas temporadas de milagres no Estoril-Praia, no Sporting e no Olympiacos. O treinador português tem estado em pleno destaque em 2017/18, com um arranque nos “hornets” que tem merecido elogios de todo o mundo do futebol e a passagem pelo futebol inglês tem sido inteiramente proveitosa para Marco Silva.
Vamos então aos pontos que foram visados logo na primeira frase deste texto. Marco Silva faz questão de ter como principal metodologia de treino a posse de bola e a organização tática. Assim o revelaram ao Bancada jogadores que já foram treinados pelo timoneiro que tem brilhado por Terras de Sua Majestade. Leandro Salino, orientado por Marco Silva no Olympiacos, explicou ao Bancada os aspetos centrais das sessões de treino que teve com o técnico português no emblema helénico.
“Ele puxava mais pela bola e dava muita atenção ao aspeto tático, ou seja, a forma como a equipa tinha que se posicionar em campo”, começou por referir o jogador brasileiro, que já passou também pelo futebol português, mais precisamente por SC Braga e Nacional. “O Marco Silva gostava que a equipa saísse a jogar, puxava muito pelos médios, pois a bola tinha que passar por eles para fazer a equipa jogar. Ele queria que os extremos se movimentassem para criar os espaços para os laterais subirem, tanto por dentro como por fora”, atestou ainda Leandro Salino.
Com a primazia pela posse de bola, seria de esperar que Marco Silva não tenha um gosto em especial pelo jogo direto, certo? Correto. Pelo menos no Olympiacos e em Portugal assim o era, tendo em conta que o futebol inglês exige, de forma mais regular, os passes longos da defesa para o ataque. “O Marco não gostava nada de bolas diretas para o ataque”, confirmou Leandro Salino.
Um dos jogadores que tem Marco Silva como uma das principais recordações na carreira é Rui Caniço. O avançado de 22 anos do Coruchense foi lançado na equipa principal do Estoril-Praia em 2013/14, pelas mãos de Marco Silva e corroborou a tese da apetência do técnico para os pilares futebolísticos de que temos vindo a falar. “Eram treinos muitos completos, trabalhando aspetos diferentes todos os dias. Procurávamos muito trabalhar o aspeto da organização tática e manutenção da posse de bola. O mister Marco gostava de ter o controlo do jogo. E a equipa encaixou muito bem a mensagem, praticava um futebol talvez dos melhores depois dos considerados ‘três grandes’. Claro que por vezes, o próprio jogo obrigava a equipa a praticar um futebol mais direto, mas as ideias passadas eram de algo mais em posse de bola”, salientou Rui Caniço em conversa com o Bancada.
📷Crédito: Will Oliver / EPA.
"Uma capacidade de motivação fora do normal, capaz de procurar a melhor forma de motivar os jogadores”.
Não só pelas questões de aspeto de treino físico e de jogo Marco Silva se destaca. O timoneiro português faz do foco motivacional uma das principais atenções a ter no balneário. “O Marco sempre nos motivou a gostar de ganhar, gostar de ser campeão. Ele mudou muito o pensamento dos jogadores gregos, tínhamos que treinar como jogávamos, com muito esforço”, atestou Leandro Salino.
Por seu turno, Rui Caniço revelou ao Bancada que o aspeto psicológico do trabalho desenvolvido por Marco Silva foi o ponto que mais o surpreendeu pela positiva quando foi treinado pelo timoneiro de 40 anos. “A nível psicológico, foi talvez onde fiquei mais admirado com o mister. Tinha uma capacidade de motivação fora do normal, capaz de ir à procura da melhor forma para motivar os jogadores, o que não deixa de ser uma tarefa difícil, visto que cada jogador tem a sua forma de se ‘motivar’. Mas, penso que ele o fazia de uma forma impressionante e isso é uma vantagem que ele tem.”
"Respeitador, cumpridor, trabalhava sempre no limite”.
É conhecida a história de Marco Silva chegar ao comando técnico do Estoril-Praia. Numa temporada era jogador do clube, na seguinte era treinador. O técnico assumiu o comando da equipa da Linha em 2011/12 e em duas temporadas no clube alcançou a subida ao principal escalão do futebol português e duas qualificações seguidas para a Liga Europa, façanhas que fizeram de Marco Silva uma das figuras mais “amadas” no conjunto “canarinho”.
Tendo sido jogador do Estoril-Praia durante seis épocas consecutivas, já enquanto atleta se notava características em Marco Silva que saltam agora à vista de todos com ele no comando técnico de equipas de topo. “O Marco era um rapaz sempre tranquilo, muito pacato, percebia-se que era um rapaz afável. Respeitador, cumpridor, trabalhava sempre no limite. Em termos de relações humanas, sempre foi uma pessoa fantástica”, afiançou Daúto Faquirá ao Bancada, tendo sido ele que foi buscar Marco Silva para a equipa da Linha, em 2005, quando o ex-jogador alinhava pelo Odivelas FC.
Rui Almeida integrou as equipas técnicas do Estoril-Praia, como adjunto, nas primeiras épocas em que Marco Silva por lá passou enquanto jogador e descreveu-o como alguém cujo interesse e astúcia faziam antever que estava ali algo mais. “O Marco era um dos capitães na altura, um jogador astuto, sempre interessado. Sem dúvida de que tinha marcas de comportamento humano que poderiam dar garantias de fazer algo como está a acontecer”, começou por referir o técnico ao Bancada.
Os elogios ao caráter de Marco Silva não ficaram por aí. “Era uma pessoa muito interessada, acima de tudo o Marco era uma pessoa que estava sempre atenta a tudo e a todos os pormenores, queria saber o porquê das decisões. O Marco queria sempre perceber quais as razões de uma decisão tática, de alterações. Ele era um daqueles jogadores que nos confrontava, pela positiva, com o conhecimento”, atestou Rui Almeida.
"O crescimento que tem tido tem sido fantástico, não só para ele, como para todos os treinadores portugueses”.
Marco Silva tem estado em pleno destaque em solo inglês, desde que chegou a Terras de Sua Majestade na época passada, para treinar o Hull City. O timoneiro português não conseguiu salvar os “tigers” da descida ao segundo escalão, mas as qualidades que demonstrou levaram-no a nova oportunidade em 2017/18, desta feita no Watford. E como tem aproveitado para mostrar trabalho… Esta temporada já conseguiu travar Liverpool FC e Arsenal e deu uma réplica bem positiva no desaire do fim de semana passado frente ao Chelsea (4-2).
Rui Almeida assistiu a esse encontro e vincou ao Bancada a importância que o trabalho desenvolvido por Marco Silva no futebol inglês tem para todos os técnicos portugueses, uma “escola” que tem vindo a colher frutos e que promete não parar por aqui. “O crescimento que o Marco tem tido tem sido fantástico, não só para ele, como também para todos os treinadores portugueses. O Marco está a marcar uma presença fantástica na Liga Inglesa, de competência, de demonstração de capacidade e a classificação diz tudo. Para além disso, também se nota a qualidade de jogo no futebol da equipa. Perdeu com o Chelsea, mas conseguiu discutir o jogo pelo jogo. Chegou e está a impor o seu jogo”, salientou o treinador em conversa com o Bancada.
Daúto Faquirá fez questão de mencionar também a qualidade do trabalho de Marco Silva, ano apenas desde que está em Inglaterra, mas desde que iniciou a carreira de treinador no Estoril-Praia. “O Marco Silva tem feito um ótimo trabalho, um percurso muito bom, logo a começar no Estoril-Praia, onde conseguiu catapultar a equipa para a Primeira Liga e depois levou-a à Europa. Depois, fez também um bom trabalho no Sporting, mesmo num contexto que não lhe foi muito favorável”, considerou Daúto em declarações ao Bancada.
Quanto a Rui Caniço, o jogador que já foi treinado por Marco Silva considerou que o técnico tem um futuro risonho pela frente. “O Marco está a um nível de topo e tem revelado isso pelas equipas em que passa. A prova disso é o campeonato que o Watford está a realizar. Tenho a certeza de que irá chegar muito longe e futuramente a um ‘grande’ europeu.” Passo a passo, pautado por um estilo de jogo ofensivo e atrativo, com posse de bola, e apostando na organização tática, Marco Silva tem vindo a subir de cotação no futebol europeu. O próximo passo? O futuro o dirá, mas tudo aponta para que seja a subir rumo ao topo do desporto rei.
*Texto originalmente publicado em Bancada.pt a 23 de outubro de 2017.
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