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  • Foto do escritorFernando Gamito

Sérgio Conceição: Liderança, ambição e fome de vitórias



Líder, carismático, exigente, apaixonado, muitas são as palavras que podem descrever a carreira de Sérgio Conceição, seja enquanto treinador ou, ao recuar uns anos, como jogador de futebol. O novo timoneiro do FC Porto ficou na memória de todos os adeptos do desporto rei, não apenas pelo que exibia dentro das quatro linhas, mas também pela personalidade vincada com que encarava os afazeres relacionados com a prática futebolística, característica que ainda transporta consigo nos dias que correm.


Mas, quem é realmente o ‘treinador’ Sérgio Conceição? Os traços característicos que o definem nos dias que correm já se encontravam em si patenteados no início da carreira de futebolista? Como foi moldada com o decorrer dos anos a imagem de liderança que hoje exibe? Que bagagem transporta de uma caminhada viajada? Que peças-chave definem a estratégia que implementa pelas equipas que passa? Será o homem certo para a cadeira no comando técnico do FC Porto?


Quando se fala de Sérgio Conceição, uma palavra absorve desde logo a mente: ambição. Uma característica tão particular, e genuína no técnico de 42 anos, que pode tão bem pintar a tela que descreve o homem, o jogador, o treinador.  


Ambição, fome de vitórias e exigência até ao limite

É norma comum que qualquer pessoa molde, ao longo dos anos, a sua personalidade face às vicissitudes que lhe sucedem. Em Sérgio Conceição, tal não aconteceu. O estilo ambicioso e faminto de vitória que hoje lhe conhecemos já se denotava quando ainda era um jovem aspirante a futebolista, de 20 anos, no Leça FC, então na época 1994/95. Quem dá conta da “forte personalidade” que já demonstrava é Constantino Jardim, antigo jogador de futebol que partilhou o balneário do emblema de Leça da Palmeira com o jovem Sérgio.


“Gostava de jogar sempre, de ganhar sempre, de fazer tudo bem. Notava-se essa ambição grande já quando era miúdo. Notava-se claramente que era muito forte a sua ambição de ganhar”, vincou sustentadamente Constantino, em declarações ao Bancada.


Porém, não apenas ao nível futebolístico, Sérgio Conceição se demarcava. Rui Lopes, antigo treinador adjunto (FC Felgueiras, Estrela da Amadora e Vitória de Setúbal, entre outros), orientou-o na equipa técnica de Jorge Jesus no FC Felgueiras, em 1995/96, e aponta traços que não são percetíveis à primeira vista. “Trabalhámos com o Sérgio ainda era ele muito jovem e já demonstrava uma capacidade acima da média em termos gerais de comportamento humano e como atleta”, salientou Rui Lopes ao Bancada.


O termo ‘derrota’ era nomenclatura que não entrava no dicionário de Conceição. “O Sérgio já tinha a personalidade vincada que tem hoje e que a demonstra enquanto treinador. Era um jogador que não gostava de perder nem a feijões, tinha uma raça enorme, com uma vontade enorme de ganhar”, revelou Carlos Secretário – antigo colega de equipa de Sérgio Conceição no FC Porto -, em conversa com o Bancada.


Os elevados níveis de exigência também fazem parte do que Sérgio Conceição representa. Assim o era enquanto jogador – “treinava sempre no limite, jogava sempre no limite, dava sempre tudo, mesmo quando estava lesionado queria treinar”, referiu Constantino -, assim o é como treinador. “O Sérgio era um jogador muito dedicado, quer no treino, quer no jogo. Por aquilo que sei, é um treinador também exigente para com os jogadores, dá muita atenção aos jogadores, faz com que eles também tenham o seu temperamento e a sua raça dentro do campo. Consegue juntar muito o grupo e, portanto, é um treinador um pouco à imagem do que era enquanto jogador”, considerou ainda Secretário.


Desde cedo um líder de balneário

Característica fundamental nos treinadores de futebol, seja em anos distantes, ou no mundo moderno do desporto rei, a capacidade de liderança pode determinar a ténue linha entre o sucesso e a tragédia. Em Sérgio Conceição, esse foi um traço característico que cedo veio ao de cima. “Já se notava perfeitamente capacidades de liderança no Sérgio [em 1994/95]. Notava-se que mais tarde iria dar treinador. Era jovem, mas tinha forte ambição, liderança, a sua opinião sempre vincada”, referiu Constantino, desvendando um pouco o véu de uma das principais ‘armas’ do futuro timoneiro do FC Porto.


A forte expressividade que tem vindo a imprimir no decorrer da carreira pode levar a conotações díspares no seio de uma equipa, mas aqui se verifica o porquê de a capacidade para liderar ser peça-chave. Sérgio Conceição sempre foi marcado por uma forte intempestividade, mas, com mais ponderação hoje em dia, conseguiu imprimir as qualidades positivas dessa característica para orientar um plantel de jogadores, de acordo com Fernando Alexandre, futebolista que foi treinado pelo técnico de 42 anos na Académica e no Olhanense.


“Quando ele chegou ao Olhanense, acabou por ser um choque pela forma dele trabalhar, de liderar, pela exigência que impõe no seu trabalho e pela paixão que, de certa forma, agarrou o grupo e traduziu-se em resultados muito positivos”, evidenciou Fernando Alexandre ao Bancada, caracterizando Conceição como um técnico com facilidade em transmitir as suas ideias, de forma a que o plantel as interiorize.


“É um apaixonado pelo seu trabalho, pelo treino, pelo jogo e pelo futebol. A paixão que impõe contagia qualquer grupo de trabalho e isso faz com que o grupo fique com ele. Em todos os clubes por onde passou, se viu claramente que há um espírito de grupo a funcionar”, sustentou ainda Fernando Alexandre, um dos jogadores que já testemunharam a liderança de Conceição, que a imprensa aponta como ser fechada ao exterior, facto que o Bancada pode sustentar, tendo em conta a recusa do médio da Académica em revelar certos aspetos e vivências particulares de balneário sob o comando do futuro timoneiro do FC Porto.


Organização e equilíbrio: peças-chave para o homem que "bebeu" da sabedoria de Jesus

Um traço comum das equipas até agora comandadas por Sérgio Conceição (Olhanense, Académica, SC Braga, Vitória de Guimarães e FC Nantes) prende-se com o rigor tático imprimido pelo treinador português no estilo de jogo, que tem por base fatores como a organização e o equilíbrio dentro das quatro linhas. Assim o evidencia Fernando Alexandre, que atua numa das posições mais cerebrais para Conceição, a de centrocampista.


“Taticamente é um treinador que é preocupado com a organização da equipa e em não conceder espaços ao adversário, manter a equipa organizada e equilibrada”, destacou o médio da Académica, nesta época emprestado ao Moreirense. “Foi um treinador diferente para mim, porque todos os treinos são virados para os princípios que ele quer para a equipa, há toda uma lógica no treino em função do jogo seguinte e daquilo que ele quer para a equipa”, enfatizou Fernando Alexandre, desvendando os processos de treino levados a cabo por Conceição.


Um vasto contributo para os traços que definem o futuro ‘comandante’ do FC Porto enquanto treinador foi o conhecimento que “bebeu” de outros técnicos, enquanto era futebolista, com Jorge Jesus a ter papel de destaque, segundo apontou Rui Lopes, adjunto do atual timoneiro dos “leões” aquando da passagem de Sérgio Conceição pelo FC Felgueiras. “É um treinador com conhecimentos muito atuais. O Sérgio ‘bebeu’ de muitos treinadores de categoria, inclusive o treinador que o apanhou e ensinou e colocou-o a fazer a ala direita toda [Jorge Jesus, no Felgueiras] no FC Felgueiras”, reiterou Rui Lopes, mencionando Conceição como uma das primeiras adaptações bem conseguidas da parte de Jorge Jesus.


Rui Lopes aproveitou para classificar Conceição como “um treinador de risco”, que não coloca de parte, de forma alguma, a consistência nos momentos defensivos do jogo. “O Sérgio incute nas equipas – se olharmos para as equipas onde esteve, nenhuma lutava para ser campeã – um cunho tático arrojado, virado para a parte ofensiva, não descurando nunca, em termos defensivos, o rigor tático e o conhecimento das capacidades da equipa adversária, tentando anular as outras equipas, mas sempre com o objetivo da vitória.”


O facto de, segundo o próprio Rui Lopes afirma, Sérgio Conceição ainda não ter orientado uma equipa com objetivos de conquista de títulos nacionais, faz com que o trabalho diário, nos treinos, seja primazia para o ainda jovem treinador, que prepara os jogos ao mais ínfimo pormenor. “Via-se nas equipas que treinou que eram balanceadas para o ataque, sabendo atacar quando têm a bola e depois, de facto, equipas que se fechavam muito bem, que primavam pelo rigor tático fora do normal. Isso trabalha-se, fruto de muito trabalho diário, em termos de treino”, corroborou o antigo técnico de Conceição.


A 'bagagem' de Conceição

Sérgio Conceição ‘aterra’ em pleno Estádio do Dragão, após um autêntico conto de fadas na sua passagem pelo FC Nantes. O treinador português chegou ao emblema francês em dezembro de 2016, com o objetivo de assegurar a permanência no principal escalão. Conceição chegou a Nantes com uma missão, mas conseguiu bem mais do que os adeptos aspiravam ‘a priori’.


Em 26 jogos disputados esta temporada no FC Nantes, Sérgio Conceição conseguiu alcançar a marca dos 13 triunfos, o que corresponde a uma percentagem vitoriosa de 50 por cento (segundo rácio de vitórias mais alto na carreira de treinador), senda que catapultou o clube da luta pela permanência até à luta pela Europa. O técnico foi acarinhado pela massa adepta dos canários franceses, que viu nele um ‘salvador’. A campanha que realizou esta época foi fulcral para a elevação do seu estatuto, que agora o coloca no FC Porto, mas o trajeto de Conceição enquanto treinador remonta a 2010/11.


Após terminar a carreira de futebolista, Sérgio Conceição assumiu funções como treinador adjunto de Dominique D’Onofrio no Standard Liège. Porém, cedo o ‘bichinho’ do cargo de timoneiro principal começou a surtir efeito. Na segunda metade da época 2011/12, assumiu o comando técnico da Olhanense, clube onde encontrou Fernando Alexandre, acima referido. Na turma de Olhão, venceu seis das 17 partidas e terminou o campeonato português na oitava posição da tabela classificativa. Na temporada seguinte, a falta de reforços e insatisfação para com a direção levaram a uma precoce saída da Olhanense.


Seguiu-se a Académica, clube no qual Sérgio Conceição começou a dar evidentes mostras de trabalho qualitativo no principal escalão do futebol português. Ainda em 2012/13, teve papel fucral na continuidade da Briosa na Liga e na temporada seguinte colocou-a no oitavo lugar do campeonato, classificação superior relativamente a anos anteriores da Académica.


Os ‘testes de fogo’ que teve até agora no campeonato português foram as passagens por SC Braga e Vitória de Guimarães, em 2014/15 e 2015/16, respetivamente. Uma delas teve final com contrastes positivos, a outra não tanto assim. Nos bracarenses, Conceição conseguiu a melhor percentagem de vitórias da carreira, com 52,2%, ou seja, 23 triunfos em 44 encontros realizados. Terminou a Liga no quarto posto e chegou até ao Jamor para disputar a final da Taça de Portugal.


Em Guimarães, Conceição venceu oito dos 31 compromissos realizados e terminou a época no décimo lugar do principal escalão do futebol português. Pela cidade-berço teve uma passagem marcada por alguns episódios de conduta incorreta e após não conseguir recolocar o Vitória nas competições europeias, saiu no término da temporada.


Em 2016/17 esteve ao serviço do FC Nantes, como já foi salientado, e deixou o clube francês com uma carta emotiva, na qual agradece pela aposta, confiança e apoio, após ter atingido a melhor classificação (sétimo lugar) do emblema no campeonato desde 2004.


Um 'Dragão' à imagem de uma casa que bem conhece

Alguém que “conhece bem a casa” que é o FC Porto. Foi assim que Rui Lopes, Carlos Secretário e Constantino Jardim descreveram a relação que Sérgio Conceição tem com o clube que vai treinar, para além de afirmarem que as suas características de luta e garra são exatamente aquilo que os azuis e brancos sustentam e o que mais necessitam neste momento. Conceição prepara-se então para regressar a um sítio bem familiar.


Enquanto futebolista, terminou a formação nos “dragões” e esteve por três épocas no clube enquanto sénior. Sérgio Conceição passou pelos azuis e brancos quando lá estavam figuras do clube Jorge Costa, Paulinho Santos e António Folha, entre outros, percursores da escola de “jogar à FC Porto” expressão bem proclamada na cidade Invicta e que nesta temporada foi várias vezes referidas por Nuno Espírito Santo.


Sérgio Conceição, aquele que em jovem era apaixonado pelo Sporting, mas que é pelo FC Porto que sente amor, prepara-se para vive o desafio mais complicado da carreira futebolística, curiosamente num espaço que bem conhece. Um regresso à casa de partida, para tentar reerguer um ‘gigante’ que tem estado adormecido nas conquistas de títulos em Portugal nos últimos quatro anos.


O que aguarda Conceição na Invicta

Com uma ‘seca’ no campeonato que dura há quatro épocas, o FC Porto parte para a próxima temporada com a urgência de conquistas de títulos, o que será o principal objetivo da estadia de Sérgio Conceição no Dragão. Na carreira enquanto treinador, o timoneiro de 42 anos ainda alcançou a façanha dos títulos, não obstante o facto de ainda não ter estado ao serviço de clubes com tão propensas aspirações de conquistas.


Os últimos anos não foram benéficos para quem se sentou na “cadeira de sonho” do FC Porto. Julen Lopetegui ainda foi poupado por Pinto da Costa, após uma época sem triunfar no campeonato, mas não resistiu até ao final na temporada seguinte. José Peseiro esteve ao leme dos azuis e brancos por meros meses, ao passo que Nuno Espírito Santo não cumpriu o contrato até ao final da duração, ao ser mais uma das vítimas do cargo, depois de um 2016/17 em branco, no que concerne a títulos.


Conceição chega, assim, ao Dragão numa fase conturbada da história do emblema da cidade Invicta. As características de liderança que o descrevem - um líder “à FC Porto” - serão fundamentais para um eventual sucesso do plantel azul e branco na época que se aproxima.


*Texto originalmente publicado em Bancada.pt a 8 de junho de 2017.

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